O contexto para a hipotermia
O organismo humano possui um sistema termorregulador que mantém a temperatura corporal em torno de 37°C a fim de manter o metabolismo basal eficaz através do equilíbrio na produção de calor (termogênese) e da dissipação de calor (termódise).
A termogênese depende da reserva de calor e do oxigênio necessário para a metabolização das reservas de energia diminuída em pessoas exaustas, hipóxicas ou traumatizadas.
A termódise depende de vestimentas e fatores ambientais.
Termólise
- Irradiação: A pele irradia calor para o meio ambiente e este esfria a pele.
- Condução: Perda de calor por contato. Depende da temperatura das substâncias que entram em contato e sua capacidade condutora. Ex.: mesa cirúrgica.
- Convecção: É uma forma especial de condução que se refere ao movimento do ar. Quanto maior a velocidade do ar, maior a transferência de calor.
- Evaporação: Perda de calor quando um líquido passa ao estado gasoso. Tem dois componentes, pele e respiração. Em cirurgias com exposição visceral pode aumentar de forma considerável a perda de temperatura.
Se tratando de ambiente hospitalar, durante um procedimento anestésico cirúrgico, foi constatado que 20% dos pacientes apresentam hipotermia no período perioperatório, principalmente causada pela ação direta das drogas anestésicas e pelo resfriamento do ambiente cirúrgico, e que 60% evoluem para hipotermia no período pós-operatório.
Causas para hipotermia
As drogas anestésicas atuam no centro de termorregulação, inibindo respostas ao frio como vasoconstrição e tremores musculares. Além de possuírem ação vasodilatadora.
Quando ocorre o fim da anestesia, a interrupção da infusão das drogas e a diminuição da concentração das mesmas no sistema nervoso central faz com que o mecanismo de termorregulação tenda a voltar ao normal, porém muitas drogas possuem efeito residual e meia vida longa, fazendo com que se prolongue a eficácia do mecanismo de regulação.
A hipotermia é considerada quando se atinge temperaturas abaixo de 36°C e pode ser leve (34°C -36°C), moderada (30°C-34°C) ou grave (abaixo de 30°C). E leva a diversas complicações pós-operatórias como alterações cardiovasculares, coagulopatias, aumento do risco de infecção, alterações hidroeletrolíticas, entre outras.
Apesar de todas essas evidências, ainda não é de costume utilizar rotineiramente monitorização para aferição de temperatura durante os procedimentos cirúrgicos. O diagnóstico precoce e utilização de medidas de aquecimento durante o ato cirúrgico é fundamental para que se evite complicações futuras.
Fatores de risco
Dentre os fatores de risco para a hipotermia os mais importantes estão relacionados à própria técnica anestésica.
Estudos demonstraram que técnicas combinadas como anestesia geral e bloqueio de neuroeixo concomitante são mais propícias a desencadear hipotermia do que técnicas isoladas. Sendo a anestesia geral a de menor risco.
Isso se deve à combinação dos efeitos diretos das drogas no centro termorregulador somado a ação vasoconstritora dos bloqueios espinhais.
O uso de opioides também tem íntima relação com a hipotermia intraoperatória, uma vez que agem no hipotálamo, quando administrados por via venosa, exercendo efeitos farmacológicos nos receptores mu do centro termorregulador assim como através dos receptores kappa periféricos da medula espinhal em bloqueios de neuroeixo.
A idade também é um fator de risco para a hipotermia. Pacientes idosos possuem uma resposta ineficaz ao calor, resposta vasoconstritora diminuída, menos massa muscular assim como menor capacidade de produzir calor.
Fatores relacionados a cirurgia como tempo cirúrgico prolongado, cirurgias abertas, sangramento, maior exposição ao ambiente frio e mecanismos de irrigação contínua no pós-operatório, contribuem para o estabelecimento de hipotermia e sua perpetuação no período pós-operatório.
Sendo assim, a diminuição dos fatores de risco somados à aferição de rotina da temperatura nos pacientes cirúrgicos, principalmente durante a primeira hora do procedimento cirúrgico é fundamental para se evitar a queda da temperatura durante a cirurgia e consequentemente evitar as complicações pós-operatórias relacionadas a hipotermia.
Uso de mantas e colchões térmicos, infusões aquecidas e aumento da temperatura do ambiente cirúrgico são medidas de suporte eficazes para manter o paciente aquecido.
Essas medidas também devem ser mantidas durante o tempo em que o paciente permanece na recuperação pós anestésica4, uma vez que grande parte dos pacientes apresenta queda da temperatura no período pós-operatório também.
Vale muito ressaltar que a Hipotermia no paciente cirúrgico é:
Comum:
- Os pacientes perdem em média 3ºC durante a anestesia6,8.
- A maior perda é durante a primeira hora de anestesia8.
- A incidência de hipotermia é de 60 a 85% no pós-operatório dos pacientes que não utilizaram sistema de aquecimento por ar, por convecção9,11.
Custosa:
- Pacientes com hipotermia custam em média US$ 7.000 ao hospitais12.
- Apresentam 2,6 dias a mais de permanência hospitalar13.
Debilitante:
- Infecção de feridas aumentam 19% nos pacientes hipotérmicos13.
- Aumento de taxa de mortalidade em 31% nos pacientes hipotérmicos14,15.
Diante de todos estes pontos críticos, o conselho federal de medicina através da resolução 2174/17 dispõe sobre a prática do ato anestésico, definindo as condições de segurança correlacionadas à utilização de materiais e condutas que garantam uma anestesia segura.
Dentre suas considerações, é determinado:
“Art. 3º Entende-se por condições mínimas de segurança para a prática da anestesia a disponibilidade de:
I – Monitorização do paciente, incluindo:
c) Determinação da temperatura e dos meios para assegurar a normotermia em procedimentos com duração superior a 60 (sessenta) minutos e nas condições de alto risco, independentemente do tempo do procedimento (prematuros, recém-nascidos, história anterior ou risco de hipertermia maligna e síndromes neurolépticas).”15
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Referências bibliográficas
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- https://pebmed.com.br/fatores-de-risco-para-hipotermia-perioperatoria/